sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Especulação traz risco de nova crise

Por: Clóvis Rossi
Davos, Suíça (ECO - Especulação traz risco de nova crise )

O fantasma de uma nova crise, tão ou mais grave do que a que assolou o
mundo em 2008/09, flutuou ontem em reuniões reservadas em Davos, a partir
da avaliação de que a não resolvida hipertrofia do sistema financeiro é um
imenso risco.
Para compreender o risco, é preciso dar um passo atrás e entender o
cenário que levou à crise, conforme avaliação obtida pela *Folha*.
Altos funcionários europeus estão convencidos de que a crise de 2008/09
foi provocada pelo fato de que as autoridades não tinham ideia de como era
e como funcionava o novo sistema financeiro, principalmente o que se
chamou "setor não bancário", fundamentalmente especulativo e mal regulado
ou não regulado.
O que traz o risco para o presente é que os governos continuam sem
entender esse setor, ainda hipertrofiado. Daí para explodir de novo é uma
questão de sorte ou de bom senso dos próprios banqueiros e investidores.
Timothy Geithner, o secretário norte-americano do Tesouro, põe números na
hipertrofia: o setor bancário nos EUA tinha, até a crise, tamanho igual ao
do PIB.
Já é um despropósito, mas na Europa a hipertrofia era maior ainda: na
Alemanha, o sistema financeiro equivalia a 3,5 vezes a riqueza do país; na
Irlanda, a oito vezes.
Outro número sobre o sistema financeiro circulou ontem por Davos: o volume
de derivativos de todo tipo, que já era de imponentes US$ 100 trilhões em
2000, saltou para US$ 700 trilhões em 2007, na véspera da crise, e mesmo
depois dela recuou pouco, para US$ 600 trilhões.
Dá dez vezes tudo o que o mundo produz de bens e serviços anualmente.
Claro que se trata de riqueza contábil, apostas em diferentes tipos de
ativos, de juros a gado, de petróleo à cotação do amendoim.
*DUAS VEZES O BRASIL*
O mecanismo de alavancagem -- pegar recursos aqui e aplicar ali --
permitiu que, em dez anos, surgisse uma indústria de US$ 3 trilhões, o que
dá duas vezes o tamanho da economia brasileira.
É até compreensível, embora não justificável, que os governos e os xerifes
dos mercados tenham sido surpreendidos pela explosão de 2008, cujo
epicentro foi a quebra justamente de um banco, o Lehman Brothers.
De lá para cá, houve esforço para apresentar nova regulação para o setor
financeiro, especialmente para os bancos. Mas os banqueiros, após período
de recolhimento porque foram socorridos pelos governos, reagiram.
Ontem, por exemplo, Jamie Dimon, executivo-chefe do JPMorgan Chase,
queixou-se de que o refrão que culpa "banqueiros, banqueiros, banqueiros é
improdutivo e injusto". Ele acha que não é correto colocar todos os bancos
na mesma cesta.
Respondeu Jean-Claude Trichet, presidente do Banco Central Europeu: "Todos
os bancos do mundo fizeram coisas que não são recomendadas pelos manuais".
Outro banqueiro, Gary Cohn, queixou-se de que mais regulação sobre os
bancos poderia levar o investidor a procurar operações de risco, como os
"hedge funds".
A afirmação entronca com a avaliação de que o risco de nova crise é
latente: até agora, os reguladores trataram de recuperar o controle sobre
o setor bancário propriamente dito, mas nem tanto sobre o sistema
especulativo. Se esse ficar hipertrofiado, como imagina Cohn, a explosão
tenderá a ser maior ainda.
28/1/2011 08:40:28 AF